“Realidades
Adaptadas”, de Philip K. Dick nos deixa uma pergunta: Quais os
limites para o controle sobre a liberdade?
Lendo
Philip K. Dick tenho a impressão de
que vivemos, hoje, em seu futuro distópico. Exceto pelas bombas
atômicas que não foram lançadas (mas quase, na crise dos mísseis), tudo aquilo que ele previa nos
seus escritos nos anos 50 já se concretizou. Robôs sencientes, a
despreocupação com a questão ambiental, o medo fazendo as pessoas
trocarem a liberdade pela segurança.
Na
coletânea “Realidades Adaptadas” (Aleph – 2012), isso pode ser enxergado de forma clara. O livro reúne sete contos escritos nos anos 50
que acabaram sendo adaptados para o cinema. Em três deles em
especial, a questão da liberdade é tratada de forma latente e o
questionamento que o autor faz é: quais os limites para o controle
sobre a liberdade?
Sem
abandonar sua escrita leve e rápida, carregada de ironia e ação,
ele questiona a intervenção dos governos e das grandes corporações nas vidas dos indivíduos. Em O Relatório
Minoritário vemos a polícia prendendo pessoas que, apenas no
futuro, iriam cometer crimes. Em O Pagamento, após ter sua memória
apagada um homem é perseguido pelo governo para revelar o que fazia
em uma megacorporação. Em O Homem Dourado, vemos como ser mais
capaz que os outros, pode custar caro.
Até
que ponto a liberdade pode ser sacrificada em favor da segurança?
Podemos ver esta mesma pergunta, sendo feita após o 11 de Setembro.
Governos invadindo casas, agências de inteligência hackeando
computadores, câmeras de vigilância espalhadas por todos os
lugares. O Big Brother de George Orwell fundamentado em nosso medo. Ao mesmo tempo em que temos medo do mundo que nos cerca, governos têm medo de que o homem, por meio de seu potencial, alcance a liberdade.
Este é um tema
presente na literatura de ficção científica. Philip K. Dick é um
dos autores que mais se preocuparam com os limites da liberdade. Um dos questionamentos do autor que mais fazem sentido é o fato de que muitos querem, para poder viver com "tranquilidade", entregar sua liberdade em troca de uma constante fiscalização.
***
Uma
guerra justifica a invasão das mentes das pessoas no intuito de
evitar crimes? Em O Relatório Minoritário, o crime pode ser evitado
por meio da precognição. Assassinatos não acontecem, mas os
“futuros” assassinos são presos mesmo assim. Pessoas são
responsabilizadas por crimes que não cometeram. A justiça tem o
direito de prender por pensamentos? O governo teria o direito de
cercear a liberdade de pensar?
No
conto O Pagamento, um técnico troca uma grande quantidade de
dinheiro por um saquinho com bugigangas. O motivo? Ele ainda não
sabe, mas quando começa a ser perseguido pelo governo, cada um dos
objetos que ele leva no pacote tem um significado. O governo quer
saber o que ele fazia dentro de uma mega-companhia. A suspeita de que
ele teria contribuído para a construção de máquinas ilegais é o
que motiva a polícia secreta em sua perseguição.
A
liberdade dele está em jogo. Entre o governo e a companhia, ele
precisa encontrar um caminho para poder viver. Sua escolha é estar
acima de tudo isso. Sua individualidade, sua capacidade de enxergar à
frente o leva a tomar a decisão que vai determinar seu futuro para
sempre. O indivíduo encontrando o caminho para a liberdade por meio
de sua própria capacidade de superar os obstáculos que a vida lhe
apresenta.
Já em
O Homem Dourado, o mundo após uma guerra é marcado pela presença
de mutantes, pessoas com superpoderes. Um deles chama a atenção por
sua capacidade de prever o futuro. Em todos os casos o governo caça,
prende e mata os mutantes, ao invés de tentar entender as diferenças
que eles representam. As pessoas não querem evoluir, avançar. O
objetivo é nivelar o ser humano por baixo, não permitir que aqueles que tem maior capacidade de sobreviver venham a triunfar, manter a mediocridade do ser humano. O próximo passo
evolutivo dá medo demais.
Philip
K. Dick deixa mais perguntas do que respostas para nós. Suas
histórias têm, em sua maioria, finais tristes e surpreendentes. Uma
certeza surge, no entanto. A liberdade é um bem muito valioso para
trocar por qualquer coisa. Seja por segurança, seja por dinheiro.
Este bem, no entanto, está sempre em perigo. Seja em suas histórias,
seja no mundo real.
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