quarta-feira, 25 de maio de 2011

50 anos a mil - Crítica do livro de Lobão



Um dia, João Luis Woerdembag Filho acordou e viu-se metamorfoseado em uma barata.

O início sintético e intenso de “A Metamorfose”, de Franz Kafka, é uma forma resumida de dizer o que as quase 600 páginas de 50 anos a mil (Nova fronteira – 2010), autobiografia de Lobão querem nos fazer acreditar: Lobão foi transformado, ao longo de sua vida, em um ser que, muitas vezes, ele não é. A mídia o fez a barata da vez. Do pequeno Joãoluizinho, como sua mãe o chamava, até o Lobão preso por porte de drogas em 1987, vemos as diversas faces do homem que escreveu, entre outras, Vida Louca, Vida, e Me Chama, sucessos nas vozes de Cazuza e Marina em um livro que flutua entre a análise de um tempo e a auto-análise de um homem.

Lobão não se poupa. Sua paixão platônica por Marina, a ocasião em que ficou preso em um elevador com Robert de Niro, a relação com sua mãe, os desentendimentos com seu pai, as tentativas de suicídio, são alguns dos episódios que vemos como que contados por alguém que viveu, mas consegue olhar de fora, analisar, avaliar as atitudes do personagem principal, não como quem olha não para si mesmo, mas para alguém muito conhecido, sobre quem não são necessárias censuras.

Tudo isso recheado das mudanças constantes pelas quais teve que passar para continuar de pé. Um caso claro de sucesso às avessas, Lobão foi redescoberto há pouco pela MTV, mediando debates, fazendo entrevistas inteligentes, usando a inteligência vasta para um meio para o qual não estava ainda preparado: a TV.

A intervenção de Cláudio Tognolli, chamado para colaborar e organizar os relatos de Lobão, é positiva. A fluidez e o ritmo da escrita de Lobão foram mantidos, o que não restringe o livro ao inflexível avanço cronológico, mas deixa a coisa mais livre e leve, como se o tempo fosse um algo vago, um espaço entre vários assuntos, que se alternam entre os parágrafos. O livro avança como se fosse o movimento das ondas, indo e voltando, mas sempre avançando até o lançamento do Acústico MTV, que venceu o Grammy Latino como melhor disco de rock.

De cansativo, apenas a parte quase acadêmica que o jornalista faz chamada de “Lobão na Mídia”, com um resumo do que saiu sobre Lobão referente aos assuntos tratados capítulo a capítulo. Muito do livro se repete ali, o que mostra que é capítulo desnecessário, algumas vezes até papel mal gasto.

Iconoclasta, irreverente, e sem medo de nada, Lobão dispara sua metralhadora verborrágica para todos os lados, falando mal, elogiando, mostrando um personagem forte. No entanto, por trás, nós conseguimos ver, escondido ainda, o menino amedrontado, o pequeno Joãoluizinho que a mãe tratava com tanto carinho e cuidado. No fim, é isso que ele é: um cordeiro, vestido na pele de lobo.

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