sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Tschick - Uma inocência nova para perder

Os jovens são eternos. Nada os amedronta, e tudo amedronta ao mesmo tempo. Sua inexperiência gera a inconsequência que os faz tomarem decisões precipitadas e fazerem besteiras. Desejar ir à Valáquia em um jipe Niva quase destruído, por exemplo.

Esta é a história de "Tschick" (Ed. Tordesilhas - 2011), de Wolfgang Herndorff. Ele fala sobre o nerd Maik Klingenberg e seu amigo russo Andrei Tschtschatschow, mais conhecido como Tschick e de sua viagem atravessando o sul da Alemanha a bordo do Niva citado aí em cima em busca da Valáquia, terra do Conde Drácula, para quem não se lembra.

A viagem é marcada por toda sorte de eventos loucos, que vão de um encontro com uma família de lunáticos até um tiroteio em uma cidade abandonada. Tudo acontece em um tempo muito rápido, muito acelerado, no intervalo entre as batidas de uma música de Beyoncé.

É da falta de pretensão que surge o melhor do livro. Nem Maik nem Tschick fingem ter conhecimentos que não têm. o livro é contado em primeira pessoa, por Maik, e há coisas que ele não entende, ainda que nós, leitores, entendamos. E este é o melhor na forma de escrever de Herndorff. Ele consegue fazer com que seu narrador realmente não seja onisciente, mas que seu leitor consiga receber toda informação necessária para construir a narrativa em sua mente.

E o conflito em Tschick não se dá no universo dos jovens. Ao contrário. É em um Niva velho, um carro destruído, em busca de uma terra evocada em contos seculares que dois jovens de 14 anos atravessam estradas de terra de uma Alemanha rural e arcaica, ao som de Richard Clayderman. Tudo na viagem deles é muito velho, e, ao mesmo tempo, muito novo. Este conflito é reflexo do mais profundo do livro, que está presente na música de Belchior "Como nossos pais". Nós não mudamos o mundo. E estes jovens também não o mudarão. Eles o explorarão, mas o deixarão como está. É este velho e vasto mundo que os transformará e fará com que se tornem outros, assim como aconteceu com todas as outras gerações (guardadas as devidas excessões e proporções).

Tschick é uma leitura rápida. De uma sentada, mas intensa em seu tempo, e interessante para tentarmos entender não apenas a geração de 14, 15 anos que temos pela frente, mas para entender como nós, adultos, de nossos 30 a 50 anos, enxergamos esta juventude, e como nos identificamos com seus anseios que não são nada mais que os nossos, de anos atrás, que fomos deixando. Eu queria ser astrônomo, Tschick e Maik queriam chegar à Valáquia. O que nós queremos, afinal?

Por fim, o livro evoca conceitos universais presentes em qualquer road book desde "On The Road", de Kerouac. A busca da liberdade, a luta pela identidade, o rompimento com a infância em face da vida adulta, a batalha contra a geração anterior. Valores que qualquer geração sempre vai carregar. Desta universalidade  Tschick se aproveita muito bem, alcançando públicos distintos. Pode-se dizer que é um livro sobre adolescentes para adultos. Sem a pretensão de ser a voz de uma geração, ele acaba conseguindo ser, em parte, a voz de todas.

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