domingo, 20 de fevereiro de 2011

Sua majestade, o samba

É fato: Chico Limeira não sabe sambar. e por melhor que seja sua música, um sambista que não sabe sambar não é sambista, ainda mais se tocar baixo e se forçar uma falsa malandragem na voz. aí a coisa é pior.

mas isso, o atraso de sua banda em passar o som (sim, além de falso sambista, Chico Limeira é atrasado), as letras pobres e desconectadas à realidade do Rio de Janeiro (não é de se surpreender. um mauricinho paraibano não vai entender mesmo o que se passa na mente e no coração de um sambista carioca e, quando tenta, cai no clichê mulher-samba-cachaça) não atrapalharam sua majestade. quando Paulinho da Viola subiu no palco já eram nove e três e o Som das Seis (????) finalmente começou.

De sorriso fácil e notável prazer em tocar, Paulinho da Viola conduziu seus súditos como o príncipe regente, regendo a orquestra de cinco mil vozes que tomou o Ponto de Cem Réis nesta sexta-feira em João Pessoa.

uma hora e vinte, vinte e duas canções, um cavaquinho e um violão cuidadosamente desafinados pela tecnica, incomodando sua majestade e um povo emocionado, emocionando o príncipe, cantando junto, acompanhando o jeito tímido do Gênio. tudo sob a lua cheia que despontava no céu claro que parecia reverenciar sua alteza.

Abriu o show sozinho, sentou no banquinho, puxou do violão, sentiu o desafino mas não se intimidou. Passaria o show inteiro incomodado com o som que não o agradara. "Coração Vulgar" e "Coisas do mundo, minha nega" mostravam que o repertório viria recheado de sucessos, quase todos seus.



"Coração Leviano", "Onde a dor não tem razão", "Sinal Fechado", "Argumento", "Pecado Capital". Sucessos que o povo cantou junto, alto, sorrindo, como Paulinho. Em "Dança da Solidão" quase não se ouviu o mestre. "Foi um rio que passou em minha vida" teve repeteco imediato para saciar os súditos de sua alteza. O príncipe desceu para brincar e purgar a tragédia por que a Portela passou algumas semanas atrás.



Mais dois sambas homenagearam a azul e branco. "O ideal é competir" de Candeia e Casquinha, mais apropriada do que nunca para o momento da escola. O samba que diz ""O que se passou passou, seu destino é lutar e vencer" e a belíssima "Lenço", de Chico Santana e Monarco, pouco conhecida do público, mas acompanhada com atenção e carinho.



Cantei junto cada uma das canções do mestre. "Procedimento", "Sinceramente", "Vela no Breu", até as novas "Para um amor no Recife", cantada em João Pessoa, e "Talismã", linda, falando de fé.

Mas é em "Ainda Mais" que eu tive meu momento com o Príncipe. ninguém ali conhecia este samba lindo, parece que só eu. O silêncio tomou o Ponto de Cem Réis. Só eu cantava com Paulinho este samba. Ele notou.



Notou e cantou me olhando, dividindo aquela canção comigo, fazendo aquele sorriso que só Paulinho sabe fazer. Dando para mim a alegria de um momento íntimo com sua alteza. Como súdito tocado pela realeza, senti-me agraciado. No final, olhando para mim e acenando com a cabeça e a palheta, apontando para mim, em sinal de aprovação.

Dali para frente, o mar me navegava. Cantei o rio que passou por minha vida e me assumi portelense desde criança. Sua majestade, o samba, me tocou, e nada mais poderia me deixar mais feliz. O samba, o grande poder transformador, me transformou. Nunca mais serei o mesmo.

Um comentário:

  1. Imagino a emoção que tomou conta de vc, tb pudera, nasceu e se criou ouvindo só boas música, ainda bem que ensinamos vc a gostar de música boa,adorei a matéria.

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